Renatinho do portal GLX entrevista Marccelus

Marcelus Bragg – Da Bahia para a internet

Conheça Marccelus Bragg, quarentão geração saúde assumido, internauta esperto que além de trabalhos com artes plásticas, consegue tempinho para criar na internet e ser correspondente do GLX na Bahia.

Por Renato Andrade – renato@glx.com.br

O que faz da vida?

Sou artista plástico e vivo da arte.

Como começou sua trajetória na internet?

Ganhei um computador do meu irmão e de cara me apaixonei pela interatividade das antigas BBS. Vim caminhando com os avanços, deixei de lado o que não me interessava e estou contente atuando hoje como webmaster e designer gay. Consegui aliar o prazer pessoal da minha própria orientação sexual com o veio criativo da computação.

A internet ajudou você em algum momento?

A informática já é parte da minha vida. Seria muito difícil agora viver sem internet. Quase tudo que faço gira em torno de um computador. Como artista plástico aprendi que o Louvre está ao alcance do mouse e que cultura tem aos montes e são inqualificáveis. Basta navegar, detonar o lixo e reter o melhor. Existe vida sim e muito inteligente no cyber espaço. Todo o tempo me sinto participando do algo novo que a internet produz.

A sua família sabe sobre sua opção sexual?

Sim. Nunca me envergonhei, tive medo ou menti sobre a minha homossexualidade. De um fato infeliz da minha infância brotou uma tolerância maior da minha família para comigo. Em 1963 uma prima minha dentista, se suicidou por conta do seu lesbianismo reprimido, deixou um bilhete. Então a minha mãe se sentiu compelida à que o mesmo não acontecesse com os seus filhos. Ela se mostrou mais compreensiva e meu pai sempre foi indiferente à essa questão. Nunca me perguntaram sobre namoradas ou me cobraram netos, etc… Tenho mais irmãos, mas nenhum que eu saiba é homossexual.

Como foi a saída do armário?

Em casa não tive problemas, mas tive que matar um leão todo dia para me manter no meu primeiro emprego. Estou lá até hoje. Tive que trabalhar mais que as outras pessoas. Me mostrar bem mais interessado e estudar pra burro pra passar no concurso. Tudo isto pra não ser demitido numa época em que não bastava apenas boas notas. Havia uma avaliação do comportamento. Mesmo assim teve gente da banca examinadora que falou “ele é viado, vamos colocar gente assim aqui dentro?”. Passadas duas décadas todos sabem de mim. Falo abertamente da minha homossexualidade se perguntado e para evitar chantagem nunca me faço passar por heterossexual. Tenho orgulho de ser gay.

Você acredita em namoros que acontecem na rede, você já conheceu alguém interessante?

Acredito mesmo e incentivo gente tímida a se jogar na rede. Não se perde noite em bar caçando, não se corre risco de uma violência urbana, roubo, assalto ou simulações, é um prazer barato e depois dado o anonimato das relações as pessoas mesmo mentindo, tendem a ser mais originais pois revelam a verdadeira personalidade [claro que gente maluca, idiota, ingênua , ruim e mal caráter existem em todo lugar, não são as salas de bate-papo as culpadas ou a internet a vilã] Apenas aconselho à que tomem cuidados. Precauções que se deve tomar quanto à dados pessoais e fatos da intimidade e da privacidade de outros. Conheci, namorei e tive excelentes relacionamentos advindos da rede.

Qual é o pior e o melhor de possuir uma página pessoal igual a sua?

Fiz uma página pessoal visando passar a imagem positiva e desencanada de um homem gay quarentão. A fiz em espanhol porque desejei aliar o meu aprendizado do idioma à minha paixão pela cultura hispânica. O resultado deu certo, tenho centenas de pessoas que me visitam diariamente, pouca gente do Brasil, mas muito internauta do resto da América e da Europa. Tive que fazer uma versão em inglês porque agora estou me direcionando ao Japão e aos demais paises da Ásia. “Não visitam o Marccelus, visitam o que fiz do Marccelus: Gay, Não egodistônico, Saudável, Afirmativo, etc…” As pessoas entenderam a mensagem da página. Muitos coroas sedentários e pouco avessos à questionamentos depois que acessaram a minha página resolveram dar uma guinada. Mudar suas vidas. São testemunhos deixados por gays que assinam o meu livro de visitas. O pior de se ter uma página pessoal é que sem querer você forma opinião e na maioria das vezes as pessoas querem conselhos, querem desabafar suas frustrações pessoais, querem ter o algo mais que você não pode oferecer. Não sou dono da verdade e muito menos me arvoro a dar palpite na vida alheia. Apenas me mostro como sou. Se a minha imagem valer para ajudar alguém. Então é ótimo. Me soa superficial esta coisa de auto-ajuda. Não quero ser hipócrita com ninguém. E no Brasil, quando não é assédio é virulência, coisa chata mesmo são os inqualificáveis e-mails com palavrões, bizarros e ofensivos que recebo é impressionante como a inveja é uma instituição nacional. Acertei em fazer a minha página pessoal em espanhol e dirigida à outro público. Embora tenha feito excelentes amigos virtuais, conhecido verdadeiros gênios da pesquisa histórica gay brasileira e navegado por sites dirigidos a comunidade glsbt que são verdadeiras páginas de ouro da temática gay. Vejo muito idealismo e profissionalismo no material homo tupiniquim que circula na net. Particularmente aqui no país prefiro sempre atuar no campo da pesquisa e registro da cultura gay sem personalismos.

O preconceito na Bahia é grande?

A homofobia é um câncer. Escondida faz mais estragos. Melhor do que eu pode falar o Grupo Gay da Bahia, que sistematiza dados de morte e violência anti-gay. Diferente da década de 80, hoje contamos uma visibilidade maior. Com o prefeito de Salvador indo a premiações Gays. O Gay Pride acontecendo em cidades jamais imaginadas. Tá melhor pros homossexuais viver na Bahia de agora. Mas, contudo não imaginem aqui um paraíso, ainda se matam gays sim, pura e simplesmente porque são gays. Ainda são os homossexuais as vítimas preferenciais para assalto e toda sorte de maquiavelice.

Você já sofreu preconceito?

Acho melhor dizer que sobrevivi a todos.

Você se considera um militante?

Sim. Milito todo o tempo a favor da homossexualidade quanto penso, faço e me mostro um homem gay realizado. Ter abrigo numa ONG ou participar ativamente de uma entidade de direitos humanos é dignificante e faz bem. Mas não é tudo. Não acredito em militante de carteirinha, acredito em bons exemplos. Em referências gays, em pessoas que mesmo não fazendo parte de grupos organizados são cidadãos que projetam nos outros a positividade do ser homossexual. Vejo isto na mídia gay. Tanta gente boa que não está ligada a ONG alguma e que dissemina informação e polemiza pro bem a questão homossexual. Cito alguns exemplos: André Fischer, Ana e Sonia do Censo GLS, Renato do GLX, Leão Lobo, Darby Daniel, Edu Moraes, Kaká di Polli, Isabelita dos Patins, são tantos mais que não quero omitir nomes de pessoas fabulosas que ajudam a construir o Brasil da dignidade

Quais os locais que você freqüenta? Onde você costuma sair nas horas vagas?

Barraca Aruba na praia da Boca do Rio, a Praia do Porto da Barra no meio dos gays. Comida chinesa que adoro no restaurante Yang Ping aos domingos sempre com amigos animados. Pouco saio à noite. Estou casado e vou com meu Pinguinho mais a eventos sociais, teatro ou cinema. Como marombeiro de plantão, não posso esquecer da academia, vocês não imaginam o quanto de gays pegam pesado nos halteres. Bom, não abro mão do Pelourinho, amo de paixão!

O que você recomenda para os rapazes que gostariam de ter um corpão malhado igual ao seu?

Comecei a treinar muito tarde, só depois dos quarenta anos. Me arrependo de não ter incorporado a cultura do fitness antes. Pego pesado, duas horas por dia, cinco vezes por semana. Consegui massa muscular sem ter a necessidade de me bombar. Uma dieta é importante. Muita fibra e carboidrato. Sem dor não há ganho de massa muscular. É necessário estar se esforçando e tentando se superar nos exercícios. Disciplina é a base do progresso. Mas tem uma coisa que é fundamental: Paciência e obstinação! Eu faço da academia uma fonte de prazer na minha vida. Estar saudável nesta fase da minha existência é essencial. Quem puder começar cedo que o faça. O halterofilismo é um esporte hiper saudável. A musculação dá trabalho, é monótona e dolorosa, mas os resultados são super gratificantes. Músculos é uma coisa que apaixona. Deveriam ter mais concursos de Mister Gays no Brasil.

Você já fez um ensaio sensual? Já foi convidado para tirar fotos eróticas?

Tem muita foto minha espalhada na net. Quem tiver a fim de ver um “coroa desibinido” vai lá na minha página, hehehehehe. Não sou e não me vejo como modelo de nada, mas se a minha imagem ajudar e incentivar a que outros homens da minha geração se mostrem mais e tenham a saudável vaidade da maturidade, então estou aqui peladão pra ajudar. Faço apologia sim, da beleza do homem maduro. Acima dos 40 há libido, erotismo, virilidade e saúde. Isto vale pra todo mundo. Se receber um convite pra posar, porque não?

O que um turista gay precisa conhecer na Bahia?

O Grupo Gay da Bahia, a mais antiga e respeitada agremiação de defesa dos direitos homossexuais. Tem uma sede linda no Pelourinho. A Ilha dos Frades, na Baia de todos os Santos, que um dia ainda vai ser a nossa Ibiza tropical e o terreiro de Pai Valdemir em Lauro de Freitas, é muito axé!

O que falta para o publico gay na região que você reside?

A revitalização do Baixo Gomes no cotidiano gay das pessoas. Bares, saunas e antigas boates da Rua Carlos Gomes agonizam. O gueto caro da Barra não reflete a gente mestiça da terra. A verdadeira Bahia Gay e pé no chão está nas barracas GLS da Boca do Rio, no tradicional Beco dos artistas no Garcia e no centrão da cidade à noite.

Contato?

marccelus@yahoo.com.br

www.marccelus.com