Miguel Falabella, inimigo repudiado pelos gays

ANTROPÓLOGO BAIANO REFUTA PERSONAGENS GAYS
O exagero de gays esteriotipados em novela de Miguel Falabella causa irritação e reação entre lideranças homossexuais do país

Por Luiz Mott

Pior judeu é o nazista, que colaborou com os exterminadores. Pior negro é o racista, que nega sua negritude discriminando outros afro-descendentes. Pior homossexual é o que tem vergonha de assumir seu verdadeiro amor, alegando não querer levantar bandeira, defendendo que sua opção sexual é questão de foro íntimo. Pior ainda quando esse gay egodistônico, além da homofobia internalizada, por suas palavras ou obras, prejudica o movimento de libertação homossexual, reforçando a homofobia sócio-cultural.

Esse é o caso de Miguel Falabella, que através das personagens “bichas loucas” de sua atual novela global A Lua me disse , tornou-se inequivocamente, o principal responsável pela manutenção do preconceito e discriminação anti-homossexual em nosso país. Sob o pretexto da liberdade de fazer humor escrachado, tem ofendido também a dignidade de negros e índios, chegando a ensinar às jovens como furar o preservativo para através de uma gravidez fraudulenta “amarrar” um amante desejado. Contra tais abusos inicia o Grupo Gay da Bahia uma campanha nacional para processar Falabella e a Rede Globo por crime de homofobia.

Mesmo tendo outrora produzido no teatro personagens gays não estereotipados, a exibição na atual novela de tantos gays ridículos, palhaços, exageradamente afetados, fazem de Falabella um dos principais responsáveis pela manutenção do preconceito anti-homossexual em nosso país. Certa vez ele disse: “acho cafajeste opções sexuais declaradas”, por que então escancarar de forma tão humilhante as opções sexuais das “bichas velhas” em sua novela?  Homossexuais conscientes, fora do armário, egosintônicos, que têm orgulho de ser gay, que lutam pela erradicação da homofobia no Brasil, sentem-se  profundamente ofendidos, ultrajados, envergonhados, com a forma preconceituosa, démodé, absolutamente desdenhosa como Falabella estereotipou  suas personagens gays da terceira idade em A Lua me disse, chamando-os de “bichas” e  “baitolas”.

Não somos contra a desmunhecação, defendemos o direito do gay ser efeminado, do mesmo modo como temos de respeitar negros rastafaris, loiras peruas, negras barraqueiras, índios e índias trajados à moda tribal,etc. O respeito à diversidade do arco-íris vale para todos. Porém, a insistência em mostrar gays ultra caricatos, desmunhecados, com vozes esganiçadas, extremamente fúteis e tiranos, além de corresponder a uma minoria cada vez menos expressiva da “cena gay” tupiniquim, reforça o preconceito anti-homossexual, já que tais personagens foram construídos exatamente para provocar o riso debochado, para estigmatizar ainda mais a “tribo” mais discriminada em nossa sociedade, já que diferentemente das demais minorias sociais, só os jovens homossexuais apanham dentro do lar por serem o que são.

Assim sendo, além de conferir a Miguel Falabella o próximo troféu Pau de Sebo  anualmente outorgado aos inimigos da liberação homossexual, o Grupo Gay da Bahia inicia uma campanha junto aos demais grupos GLTB do Brasil e do exterior, articulando-se com o Movimento Negro, o Movimento Indígena, OAB e principais entidades defensoras dos Direitos Humanos,   igualmente ofendidos e revoltados pelo racismo e etnocentrismo divulgados em A Lua me disse, a fim de processar Miguel Falabella e a Rede Globo por divulgação de preconceito e discriminação contra tais minorias sociais. Se os atores Victor Fasano, Thiago Lacerda e Luciano Szafir conseguiram na Justiça fabulosas indenizações, alegando terem  sua imagem ultrajada pela divulgação de que eram  praticantes do “amor que não ousa dizer o nome”, nada mais  justo condenar e multar  com o mesmo rigor Miguel Falabella e  a TV-Globo por ultrajarem mais de 18 milhões de cidadãos brasileiros homossexuais  além de negros e índios –  cuja imagem é  gravemente vilipendiada, toda noite,  em todo território nacional.

A TV brasileira nunca teve um folhetim com tantas referências ao mundo gay quanto A Lua Me Disse
Divulgação

A Lua Me Disse: guerra de cabelos e sadomasô

Nunca se viu uma novela tão GLS – sigla para “gays, lésbicas e simpatizantes” – quanto A Lua Me Disse. O atual folhetim das 7 da Rede Globo tem três personagens homossexuais: Samovar (Cássio Scapin), bon vivant que
sofre de amores por um heterossexual; Coriolano (Agildo Ribeiro), um gay da terceira idade; e Dona Roma (Miguel Magno), marmanjo que se veste de mulher. A “simpatia”, no entanto, vai muito além disso. É uma questão de tom: há referências ao universo gay em vários detalhes, do figurino aos diálogos. “A novela é GLS mesmo. O mundo se tornou GLS!”, diz o autor Miguel Falabella, com exagero tipicamente… GLS. A audiência tradicional do horário das 7,
formada por crianças, adolescentes e donas-de-casa, pode nem notar. Mas o público homossexual se diverte com cenas como aquela em que a megera Madô (Débora Bloch) tem uma “briga de cabelos” com outra personagem – quer dizer, elas se golpeiam com as madeixas. “O pessoal se identifica com os diálogos escrachados e a estética da novela”, diz o doutor em teoria estética pela USP e militante gay Wilton Garcia. Além de Madô, há peruas como Ademilde (Arlete Salles), que se vestem num estilo camp – a versão gay do cafona. E a toda hora os personagens usam expressões correntes no circuito do arco-íris,
como “bofe” (para definir homens másculos) e “bas-fond” (agito).

Até agora, a audiência parece não ter se incomodado com os liberalismos de A Lua Me Disse. No ar há quase dois meses, a novela registra a média de 35 pontos no ibope – marca que a Globo considera satisfatória para o horário.
Como a trama recorre àquele besteirol típico dos folhetins das 7, muitas referências se diluem em meio ao puro nonsense. Dez dias atrás, houve até uma cena de sadomasoquismo – de brincadeira, é claro. Em encontro com um namorado que conheceu pela internet, a personagem de Arlete Salles descobre que o sujeito gosta de se vestir de couro e ser chicoteado. O ator Ricardo
Petraglia, que encarnou o tal namorado, ficou constrangido. Na semana passada, houve outro momento emblemático: o abdômen do ator Pedro Neschling foi mostrado em close, enquanto ele fazia ginástica ao som de dance music.
No que depender de Falabella e de sua parceira na autoria da novela, Maria Carmen Barbosa, o apelo GLS não vai parar. Eles prevêem a entrada de uma lésbica na trama em breve. E, no fim do mês, deve-se gravar uma cena na
Parada Gay do Rio de Janeiro. Definitivamente, A Lua Me Disse é uma novela que saiu do armário.

Fonte: Revista Veja

Luiz Mott

Decano do Movimento Homossexual Brasileiro, Doutor em Antropologia, Comendador da Ordem do Rio Branco
Fone: 71- 3328.3782  9128.9993
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